Economia: O Brasil está preparado para enfrentar a crise?
Sobre os juros estratosféricos praticados no Brasil:
Foto: Roberto Requião - Senador PMDB/PR
"Estão a tratar com homeopatia uma doença
que precisa de medicamentos fortes”
Poucas horas depois do anúncio das maiores quedas de bolsas de valores dos últimos meses - mais de 8% no Brasil e de 5% nos Estados Unidos - dois representantes da equipe econômica do governo malograram na tentativa de demonstrar, em audiência pública no Senado, que o país estaria "atento aos riscos da crise internacional". Não está, pois o diagnóstico feito é equivocado, e a profilaxia é homeopática.
Em debate sobre a situação do sistema financeiro mundial, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE), ambos apontaram como fator determinante para uma "economia brasileira excessivamente bem preparada” o aumento das exportações [commodities] e o [super]dimensionamento das reservas internacionais.
A dimensão da crise atual, porém, foi ressaltada pelo diplomata Paulo Roberto de Almeida, professor de Economia Política do programa de mestrado e doutorado em Direito do Uniceub, para quem "o crescimento econômico dos países avançados continuará lento e levará cerca de quatro a cinco anos para recuperar os padrões de antes de crise", previsão esta originalmente publicada pelo notório e prestigioso economista Nouriel Roubini.
- "A dívida cresceu enormemente, a dos Estados Unidos subiu o Everest e será um problema que chegará a mais duas gerações. Haverá uma lenta diversificação de reservas, mas os Estados Unidos ainda são a economia mais flexível do mundo e vão continuar atraindo capitais pelo futuro previsível. Mas o dólar vai diminuir de valor, no momento em que placas tectônicas estão se movimentando e o Atlântico Norte perde espaço para o Pacífico Norte" - comparou.
Esses movimentos, na opinião do diretor para o Brasil do Banco Mundial, Makhtar Diop, estarão também relacionados ao aumento do peso político dos países considerados de renda média. Em sua opinião os próximos anos ainda serão de muitas indefinições.
- "Existe hoje uma grande incerteza, e o mundo vai necessitar de um papel maior dos países de renda média", afirmou.
Após ouvir as exposições dos participantes do debate, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) disse que a mesa havia falado sobre "outro país". Ele ressaltou a queda de 40% nas exportações industriais brasileiras nos últimos 30 anos e queixou-se da "primarização de nossa economia", com ênfase para a exportação de minérios e produtos agrícolas.
De todos os participantes, pasmem, Requião foi o que se mostrou mais lúcido. Ele, com razão, alertou para o risco de queda das cotações das commodities, no caso de os Estados Unidos entrarem em nova recessão e afetarem em consequência a China, grande compradora de produtos primários brasileiros.
O Senador do Paraná elogiou o corte de meio ponto percentual na taxa Selic na última reunião do COPOM. Mas, alertou que ainda falta muito para o Brasil se tornar um país competitivo.
- “Nós, tirando a inflação prevista para o período, estamos agora com a redução de meio ponto com juros de 5,5% ao ano na taxa Selic. Com os juros assim, não há como fazer o país investir, inovar, crescer industrialmente”, alertou.
- “A Hungria, com juros de 1,3% ao ano, está em segundo lugar. Menos da metade do Brasil. O Chile com 1,9%. A Indonésia com 1,8%. O México com 1,3%. A Austrália, com 1,1%. A Rússia com 1% ao ano. A Colômbia com 0,7%. Taiwan com 0,5% e a China com 0,4%. E outros países, entre os 40 países mais importantes do mundo, têm juros negativos para estimular o crescimento industrial”, citou.
- “Uma previsão das despesas do Governo Federal para este ano de 2011 prevê que o Governo vai gastar R$ 240 bilhões só com o pagamento dos juros da dívida pública. E vai gastar apenas R$ 44 bilhões em investimentos”, exemplificou.
- “Esta política tem que mudar. Os discursos da presidente Dilma e do ministro (Guido) Mantega são corretos. Mas a prática é extraordinariamente tímida.
- Estão a tratar com homeopatia uma doença que precisa de medicamentos fortes”, finalizou.
O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), que presidiu o debate, elogiou a intervenção do Senador Requião, ressaltando também a necessidade de maiores investimentos em tecnologia e rechaçando análises feitas por laureados economistas dos países centrais de que "banqueiros foram irresponsáveis"; pelo contrário, "são sempre responsáveis nas suas voracidades", disse. Acrescentou ainda que o "Brasil não tem futuro se continuar apenas exportando minérios".
Por sua vez, o senador Luiz Henrique (PMDB-SC), por ter ficado por último, sentia-se "prejudicado" pois pouco haveria a acrescentar senão externar sua preocupação com a adoção de medidas para garantir "consistência atuarial" ao sistema de previdência social, com o aumento da expectativa de vida.
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