Gestão Empresarial: Autoridade x Autonomia

Ciências Sociais
Sobre a Autoridade
"Hoje, as favelas são as senzalas, e os vergalhos se vêem aos montes nas grandes empresas. 
Mas, estes se julgam Senhores. É a glória!" 
(Tato de Macedo)

Alguns "democratas" de última hora - sobretudo os mesmos que, outrora, deram sustentação  a regimes perversos de autoritarismo - abríram, nestes últimos tempos, uma  feroz campanha em regra contra aquilo a que chamam o princípio da autoridade. Basta decidir sobre este ou aquele ato, mesmo que se reconheça necessário, mas que ao contrariar seus vis interesses para ser tachado  e condenado de autoritário. Abusam de tal modo desta maneira sumária de proceder que é preciso examinarmos a coisa mais atentamente. 
  • Autoridade, no sentido próprio da palavra, quer dizer: imposição da vontade de outrem sobre a nossa; e, por outro lado, autoridade supõe subordinações. 
Ora, na medida em que estas duas palavras soam mal e que a relação que representam é desagradável para a parte subordinada, trata-se de saber se há meio de passar sem elas e se - dado as atuais condições da sociedade - poderemos dar à vida um outro estado social no qual essa autoridade não tenha mais razão de existir e onde, por conseguinte, deva desaparecer. 

Examinando as condições econômicas, industriais e agrícolas que estão na base da atual sociedade de consumo, verificamos que tendem a substituir cada vez mais a ação isolada pola ação combinada dos indivíduos. 

A indústria moderna substituiu as pequenas oficinas de produtores isolados por grandes fábricas regionais, num primeiro momento, com oficinas onde centenas de operários vigiavam máquinas complexas movidas pelo vapor; os carros e as camionetas nas grandes estradas foram suplantados pelos comboios nas vias férreas, tal como as pequenas escunas e faluas à vela, o foram por barcos a vapor. 

E, num segundo estágio de dominação, foram-se fundindos e formando verdadeiros impérios multinacionais com operações descentralizadas por regiões que lhes ofereciam as melhores oportunidades de acesso à matéria-prima, benefícios fiscais, mão-de-obra barata e abundante, logística e escoamento de produção aos maiores e mais promissores mercados, tendo todos sem exceção como características comuns: 
  1. a concentração das riquezas produzidas no topo das pirâmides organizacionais;
  2. a promessa de mobilidade social a partir do convencimento  pueril de ascensão a cargos de comando, de direção, de prestígio;
  3. a ambição desmedida disseminada por entre estratos inferiores como estratégia (astuta) de desunião daqueles que deveriam, por justiça, usufruir dos bens produzidos;
  4. os baixos salários, a inacessibilidade à educação de qualidade, o abandono social e a miséria como recompensas ao esforço empreendido pelos "recursos humanos" - energia a movimentar a roda da fortuna do Grande Capital.
A própria agricultura caiu pouco a pouco no domínio da máquina e do vapor, os quais substituíram, inexoravelmente, os pequenos proprietários pelos grandes capitalistas que, com a ajuda de operários assalariados, cultivaram grandes áreas de terras doadas pelos poderes constituídos. Em todo o lado a acão independente dos indivíduos foi substituída pela ação combinada, envolvendo complexos processos interdependentes. 
  • Eis o cerne da questão, pois quem diz ação combinada, diz organização; ora, seria possível uma organização sem que houvese autoridade?
Suponhamos uma revolução social que venha a destronar os capitalistas que dominam, agora, a produção e a circulação das riquezas. A suposição serve para nos colocarmos por completo no ponto de vista dos antiautoritários, que a terra e os instrumentos de trabalho se tornarão a propriedade coletiva dos trabalhadores que os empregam. 
  • A autoridade terá desaparecido ou terá pura e simplesmente mudado de forma? 
Vejamos. Tomemos, como simples exemplo de assimilação, uma fiação de algodão O algodão deve passar por, pelo meno,s seis operações sucessivas antes de ser reduzido a fio; operações que se fiam, na sua maioria, em salas diferentes. Além disso, para manter as máquinas em movimento, é preciso um engenheiro que vigie a máquina a vapor, mecânicos para as reparações quotidianas e numerosos serventes que transportem os produtos de uma sala para a outra, etc.

Todos estes operários, homens, mulheres e até crianças - pasmem - são obrigados a começar e a acabar o seu trabalho a horas determinadas pela autoridade do vapor que não se importa nem um pouco com a autonomia individual. É preciso pois, primeiramente, que os operários se entendam quanto às horas de trabalho, e que essas horas, uma vez fixadas, se tornem a regra para todos, sem nenhuma exceção, óbvio. 

Depois, em cada uma das salas e constantemente, surgem questões de detalhe sobre o modo de produção, sobre a distribuição dos materiais, etc., questões que é preciso resolver imediatamente, sob pena de ver parar toda a produção; quer se resolvam pela decisãode um supervisor delegado a cada ramo de trabalho, ou, se possível, pelo voto da maioria, a vontade individual deve sempre subordinar-se; 
  • logo, quer isto dizer que as questões  são resolvidas autoritariamente
O mecanismo automático de uma grande empresa é bem mais tirânico do que alguma vez o conseguiram ser os pequenos capitalistas que empregam os operários. Pelo menos nas horas de trabalho pode-se inscrever na porta da fábrica: 
  • Lasciate ogni autonomia voi che entrate! (*). 
Se, pela ciência e pelo seu génio inventivo, o homem submeteu as forças da natureza, estas vingam-se submetendo-o, já que delas se usa, a um verdadeiro despotismo independente de qualquer organização social. Querer abolir a autoridade na grande empresa, é querer abolir a própria essência do capitaismo, é destruir afiação a vapor para voltar à roca de fiar. Tente repetir na vida real, no seu local de  trabalho, o gesto do herói de Hollywood encarnado na personagem do bruxinho audacioso em O Senhor dos Anéis contra um malévolo Goblin, e descobrirá, por si mesmo, o que venha a ser a essência do capitalismo.

Tomemos, como outro exemplo, uma estrada de ferro. Também aí, a cooperação de uma infinidade de indivíduos é absolutamente necessária, cooperação que deve ter lugar em horas bem precisas para que não ocorram desastres. Também aí, a primeira condição para o seu uso é uma vontade dominante que resolva todas as questões subordinadas, vontade representada quer por um único supervisor delegado, quer por um departamento encarregado de executar as decisões de uma maioria de interessados.
  • Num e noutro caso, há uma autoridade muito pronunciada. Mais: que aconteceria ao primeiro comboio que partisse se se abolisse a autoridade dos empregados da estrada de ferro sobre os senhores passageiros? 
Mas a necessidade da autoridade, e de uma autoridade imperiosa, não pode ser mais evidente que num navio em alto mar. Aí, no momento do perigo, a vida de todos depende da obediência instantânea e absoluta de todos à vontade de um único.

Quando avanço tais argumentos contra os mais furiosos anti-autoritários, estes não sabem o que responder:
  • "Ah! Isso é verdade, mas o que damos aos supervisores delegados não é uma autoridade, mas sim uma missão!".  
Quanta meiguice, não? Estes senhores julgam ter mudado as coisas quando só mudaram os nomes. Eis como estes profundos pensadores gozam com as pessoas. Acabamos pois de ver que, por um lado, uma certa autoridade, atribuída não importa como, e, por outro lado, uma certa subordinação soa coisas que, independentemente de toda a organização social, se imponhem a nós devido às condições nas quais produzimos e fazemos circular os produtos.

Vimos, além disso, que as condições materiais de produçoão e da circulação se complicam inevitavelmente com o desenvolvimento da grande indústria e da grande agricultura e tendem cada vez mais a estender o campo dessa autoridade. 
  • É pois absurdo falar do princípio da autoridade como de um princípio mau em absoluto, e do princípio da autonomia como de um princípio bom em absoluto. 
A autoridade e a autonomia são coisas relativas cujos domínios variam nas diferentes fases da evolução social. Se os autonomistas se limitassem a dizer que a organização social do século XXI restringiria a autoridade aos limites no interior dos quais as condições de produção a tornariam inevitável, poderíamos entender-nos; em vez disso, permanecem cegos perante todos os fatos que a tornam necessária, e levantam-se contra a palavra.
Por que  os anti-autoritários não se limitam a erguer-se contra a autoridade política, contra o Estado?

Todos os socialistas concordam em que o Estado político e com ele a autoridade política desapareceriam como conseqüência da próxima revolução social, ou seja, que as funções públicas perderiam o seu caráter político e se transformariam em simples funções administrativas protegendo os verdadeiros interesses sociais.
Ocorre que os anti-autoritários pedem que o Estado político autoritário seja abolido de um golpe, antes mesmo que se tenham destruído as condições sociais que o fizerom nascer. Pedem que o primeiro ato da da suposta revolução social seja a abolição da autoridade.

Já viram por acaso, estes senhores, alguma vez uma revolução? Uma revolução é, certamente, a coisa mais autoritária que se possa imaginar; é o ato pelo qual uma parte da população impõe a sua vontade à outra por meio das espingardas, das baionetas e dos canhões. Meios autoritários como poucos; e o partido vitorioso, se não quiser ser combatido em vão, dever-se-á manter o seu poder pelo medo que as suas armas inspirem aos reacionários.

A Comuna de Paris teria durado um dia que fosse, se não se servisse dessa autoridade do povo armado face aos burgueses? Não será verdade que, polo contrário, devemos lamentar que não se tenha servido dela suficientemente?

Assim, das duas uma: ou os dito "anti-autoritários" não sabem o que dizem, e, nesse caso, só semeiam a confusão; ou, sabem-no, e, nesse caso, atraiçoam o movimento em prol das camadas sociais alienadas, dominadas, pauperizadas, excluídas, enfim, do sistema de bem-estar socioeconômico.
Tanto num caso como noutro, só servem a reação.
(*) - "Vós que aqui entrais, abandonai toda a autonomia!" - Dante, "A Divina Comédia - O Inferno", Canto III.

Tato de Macedo
(em base do artigo de F. Engels - Sobre a autoridade, 1873 - In The Marxists Internet Archive)

Comentários

Anônimo disse…
Oi, tatinho lindo . Tudo bem com vc?

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