Inflexões: Somos todos inocentes, mesmo com provas contrárias

Política & Corrupção



Diante de tanto($), como discernir? 


Por Carlos Alberto Gianotti
Professor e editor na Unisinos

O motorista do táxi foi peremptório quando iniciou a conversa para o trajeto: “Pouca vergonha essa corrupção, essa turma das empreiteiras e dos políticos está abiscoitando milhões, agora mesmo estava ouvindo no rádio que o presidente do Senado está envolvido!” Murmurei alguma coisa e assenti com a cabeça, enquanto pensava sobre as certezas daquele homem com relação às informações. Eu jamais consegui chegar a tanto, nutro mais dúvidas do que convicções intelectuais. Assim, a cada novo imbróglio que surge esmiuçado pela mídia, como este caso da Gautama, sou assolado pela pergunta: onde estará a frincha para divisar a verdade?

Uma das certezas de educadores e intelectuais é que a educação e a leitura levam as pessoas a aguçar sua capacidade crítica para chegar mais próximas da verdade. No entanto, essa capacidade crítica que se deseja induzir no educando para ele melhor viver a vida adulta pode parecer inútil se se partir da tradição hobbesiana de que o individual sempre prevalece e me é assegurado moralmente negar aquilo que de fato fiz.

Assim, por exemplo, quando a PF prende algumas dezenas de pessoas sob evidência de corrupção eessas pessoas negam definitivamente que cometeram tal ilícito, tentam driblar as imputações afirmando, talvezcom desfaçatez, que não é nada disso, que provarão sua inocência, me pergunto onde radica a verdade possível.

Quando um ministro de Estado e o presidente do Congresso - que a sociedade pressupõe cidadãos ilibados, pois não estariam em tão altas funções tipos cafajestes - são acusados de beneficiarem-se pessoalmente daquelas suas condições públicas e declaram que são inocentes das acusações, outra vez fica embaçado o meu discernimento.

Quando, por outro lado, leio que algumas autoridades acusaram a PF de fazer “espetáculo” na prisão dos "presumíveis" corruptos, sinto a ferroada da dúvida. Quando as chamadas autoridades competentes, após vários meses de investigação, informam quem são os culpados no maior acidente da aviação comercial brasileira - e estes se defendem alegando inocência e inculpando outrem -, me pergunto sobre a verdade.

Quando assisto a debates pela TV, que supostamente visam a oferecer condições para o telespectador melhor julgar sobre temas “palpitantes”, acabo entediado e incapaz de dizer quem está com a maior fatia de razão sobre o tema pautado.

E então, suspicaz, sou levado a conjeturar se aquela faculdade crítica, tão valorizada no discurso doseducadores e intelectuais, não terá mesmo é a serventia maior de me impossibilitar o julgamento dos agentes e de suas ações, de me impedir de discernir de forma afoita de que lado está a verdade, que, parece, insiste sempre em menear. Paradoxalmente, seria como se o discernimento impedisse o discernimento.

Depois, conjeturo ainda: não estaria mais em paz com o mundo dos acontecimentos aquele motorista de táxi que ouviu a nota no rádio e estabeleceu taxativo o lado da "verdade"?


(Texto disponível em: http://www.clicrbs.com.br/jornais/zerohora.)

Comentários: Flagrante, no caso acima, a posição partidária dos três ministros do Supremo  - Toffoli, Grau e Mendes (ou seria Dantas) ao afirmarem que provas demonstradas não provam nada. É a tal "inocência presumida".

Talvez, se o meritório professor se locomovesse numa metrópole como São Paulo de ônibus, trem ou van descobrira outras verdades que a classe mérdia abastada (e bastarda), aspirantes desde sempre a privilégios seculares, desconhece.

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